A vitória inconsistente do socialismo soou como o início de uma corrida louca das esquerdas para caotizar a Europa e só foi possível graças ao “Sarkocídio”.
Marcelo Dufaur
No dia 6 de abril último, François Hollande, candidato presidencial do Partido Socialista Francês (PS), compareceu diante da multidão que comemorava sua vitória na histórica Praça da Bastilha. Contudo, a conhecida revista alemã “Der Spiegel”1 comentou que, diante daquela praça cheia, o vencedor sentiu um calafrio e um desabamento psicológico.
O normal seria que estivessem ali os continuadores dos sanguinários sans-culotte que incendiaram a França do Ancien Régime, guilhotinaram o rei Luis XVI e fecharam as igrejas — os verdadeiros socialistas inimigos da desigualdade — da família e da propriedade. Mas não foi assim. Quais eram as bandeiras que a multidão agitava? As de países islâmicos, de movimentos homossexuais, da União Europeia, do Partido Comunista Francês, uma ou outra bandeira nacional, e poucas, muito poucas, do próprio PS (fotos abaixo). A escassa visibilidade destas últimas talvez se deva ao fato de a campanha socialista ter trocado sua histórica cor vermelha por um branco pálido, ou a mistura de branco com azul-bebê.
Durante sua campanha, Hollande quis assemelhar-se a seu predecessor socialista François Mitterrand: assumiu seus gestos e poses, tentou imitar sua voz. Mas naquele momento a coragem lhe faltou.
“Vitória pudim”
Apelidado por alguns de Flanby — em alusão a um pudim industrial da Nestlé, de fraca consistência e pouco sabor —, Hollande presidiu à comemoração de uma “vitória pudim”, tão consistente quanto a imagem que ele tentou passar de si para obter a benevolência do eleitorado.
“Monsieur Normal” — outro apelativo que lhe foi dado — tem experiência política suficiente para medir a falta de conteúdo de sua vitória. Ele não venceu porque suas ideias, propostas ou preferências conquistaram os franceses; a causa de sua vitória foi uma só: aquilo que um jornalista chileno sintetizou numa palavra: Sarkocídio!2
O Partido Socialista não só não progrediu numericamente, mas diluiu seu pensamento e seus objetivos aparentes, a ponto de causar entre as esquerdas mundiais o pânico de Hollande vir a ser “o derradeiro coveiro dos partidos socialistas e social-democratas europeus”.3
A maioria silenciosa da França continua sendo uma significativa maioria e talvez mais arredia às propostas revolucionárias do que nunca. Uma das provas mais comentadas disso foi o crescimento histórico da chamada “extrema direita”, o Front National, bem como a recuperação de votos de Sarkozy na reta final da campanha, agitando — sinceramente ou não — teses ou slogans do Front National.
A direita majoritária praticou harakiri
"Monsieur Normal": François Hollande, novo presidente francês |
Os números não foram tranquilizadores para o Flanby, pois, no cômputo final, apenas 39% do eleitorado votaram nele. E não só sua vitória foi obtida com uma margem de votos considerada pequena (1.131 milhão) como 2.147 milhões de eleitores — na sua maioria de direita, descontentes com as promessas não cumpridas do presidente derrotado — votaram em branco, quase o dobro da margem da vitória. Embora na França o voto não seja obrigatório, esses direitistas quiseram ir votar em sinal de protesto. Ouvi essa conversa no domingo da votação:“Como teremos de escolher entre dois demônios, votaremos em branco para fazer sentir nossa revolta diante da falta de opção”.
Se eles tivessem sido mais esclarecidos, votando contra a esquerda e deixando o protesto para depois, Hollande teria perdido — cúmulo da vergonha! — para o antipatizado Nicolas Sarkozy! Estatisticamente, se o eleitorado de direita que no primeiro turno não votou em Sarkozy o tivesse feito na mesma proporção que o eleitorado de extrema-esquerda que votou por Hollande, o candidato da direita teria sido reeleito. Neste sentido, o mais certo não é dizer que a esquerda ganhou, mas que, embora majoritária e em progressão, a direita praticou harakiri. E o candidato “pudim” se tornou presidente!
Compreende-se que diante da tendência à direita da opinião francesa, Hollande tenha escolhido a imagem do “pudim” e substituído o vermelho pelo branco e azul-bebê.
Dilema de Hollande
Mas a imensa revolução que os ideólogos socialistas e o próprio Hollande acalentam não se faz com “pudim” e azul-bebê. É fácil, simpático e rentável falar mal da austeridade, prometer menos horas de trabalho, aposentadoria mais cedo, salários mais altos, bolsas para tudo e qualquer coisa. Era o que a multidão de lata de cerveja na mão, na Praça da Bastilha, queria ouvir e ovacionava. Mas essa multidão já não era mais a dos transloucados sans-culotte, dispostos a passar penúria ou dar a vida pela Liberté-Égalité-Fraternité que aquela mesma praça relembra!
O novo presidente socialista declarou: “Meu verdadeiro inimigo é o mundo das finanças”. A crise financeira que devasta Europa deixou os bancos na dependência de auxílios dos governos ou organismos internacionais. A frágil situação deles pode propiciar nacionalizações como François Mitterrand tentou na década de 1980. Hollande vai ser muito aplaudido pelas esquerdas no primeiro dia. Mas, em pouco tempo, poderá ser mais vituperado que seu mestre e obrigado a reprivatizar urgentemente o que nacionalizou num ato de euforia socialista utópica.
Se o novo presidente cumprir suas sedutoras e utópicas promessas, levará a já muito fragilizada economia francesa à degringolada, tendo então que pedir fortes sacrifícios a seus seguidores, que não querem saber disso. Se não as cumprir, o PS, último reduto partidário viável das esquerdas, afundará. Em qualquer caso, uma das consequências já anunciada é que seu fracasso engrossará cada vez mais as hoje extensas fileiras da “extrema direita”.
Revolução Cultural: via régia para Hollande
Os governos europeus foram delegando atribuições cada vez maiores à União Europeia, tornando com isso estreita a margem de manobra de Hollande. Entretanto, valendo-se do prestígio que todo presidente francês tem — curioso eco na França republicana do prestígio real na França monárquica — ele poderá imiscuir-se em praticamente todos os assuntos de governo.
No governo, o Partido Socialista tentará certamente aprovar o “casamento” homossexual, indo além da atual união civil, atacar o ensino privado — que revela ter boa saúde dentro das brutais limitações impostas por governos anteriores — e acentuar a ofensiva pela eutanasia.
Quando isso se der, será indispensável uma articulação sensata das direitas francesas para conter a ofensiva socialista. Portanto, o oposto da política Sarkocídio. Terão as direitas francesas, tão diversificadas e divididas, suficiente largueza de vistas para se coligarem contra o inimigo comum?
Esquerdas europeias relançam a ofensiva
A fraqueza da “vitória pudim” de Hollande não foi devidamente focalizada pela mídia internacional. O viés informativo da grande mídia funcionou como a batuta de maestro que dá inicio a uma partitura endiabrada.
Assim, animados pelo “sucesso” francês, os “indignados” espanhóis voltaram à Porta do Sol e a outras praças da Espanha. Desconhecidos terroristas italianos lançaram coqueteis molotov contra prédios do governo, considerados por eles como emblemas odiosos da austeridade. A chanceler Angela Merkel, símbolo da política de reerguer as economias, perdeu em recentes eleições o controle da mais importante região alemã, vendo entrar em Parlamento estadual até o anárquico Partido Pirata.
A ingovernabilidade da Grécia aproxima a hora em que ela será forçada pelos demais países da eurozona a abandonar o euro. Se tal saída for feita de modo ordenado, poderá ser benéfica a longo prazo, mas terá, de imediato, consequências duríssimas para os gregos. Ademais, se a desconfiança prevalecer nos mercados, a notória ausência de solidariedade na eurozona poderá provocar um pânico bancário ou pelo menos uma emigração massiva dos depósitos nos bancos dos países fragilizados do sul para bancos de países do norte, considerados mais seguros. O que semearia o caos financeiro em toda a Europa, a começar por Portugal, Espanha e Itália, cujas economias já deram estalos relacionados com o montante de suas dívidas, o aumento inexorável do desemprego e o estancamento da atividade econômica.
A vitória de Hollande parece ter dado a largada de uma corrida louca das esquerdas para abalar o que resta de ordem na Europa. Não terá sido a primeira vez que um fato pobre de conteúdo, mas apresentado de modo tendencioso pela imprensa, gera uma tempestade de consequências imprevisíveis.
E-mail para o autor: catolicismo@terra.com.br
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Notas:
1.http://www.spiegel.de/international/europe/analysis-of-election-victory-of-french-president-fran-ois-hollande-a-831762.html
2. http://blogs.elmercurio.com/columnasycartas/2012/05/08/sarkocidio.asp
3. http://expresso.sapo.pt/daniel-oliveira-antes-pelo-contrario=s25282
Notas:
1.http://www.spiegel.de/international/europe/analysis-of-election-victory-of-french-president-fran-ois-hollande-a-831762.html
2. http://blogs.elmercurio.com/columnasycartas/2012/05/08/sarkocidio.asp
3. http://expresso.sapo.pt/daniel-oliveira-antes-pelo-contrario=s25282
Fonte :Revista Catolicismo
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